terça-feira, 28 de julho de 2009

Barómetros, estatísticas e outras desinformações



Jamais será inocente a emissão noticiosa de estatísticas sobre o embuste da solução Ibérica. Tais ideais iberistas poderão até ser tingidos pela cor unificadora da nova identidade europeia, mas têm implícitos a lusa crença sebastianista de que a nossa salvação virá de fora, numa qualquer manhã de nevoeiro.

Os repentes iberistas, inclusive em Portugal, não são novos. Mas entre os nossos vizinhos tais pretensões têm sido mais evidentes e nunca deixaram de fazer sentido para as elites do poder castelhano; com efeito, relembro que a tese de Doutoramento do Generalíssimo Franco era sobre como invadir Portugal em 48 horas - mais horas menos horas... e isto passou-se há menos de 70 anos.

Também recordo um excerto do diálogo entre um alto dignitário espanhol, o Capitão-General Muñoz-Grandes, e o nosso Embaixador Franco Nogueira, na altura Ministro dos Negócios Estrangeiros:

- "Eu lhe digo. Há, em relação a Portugal, duas classes de espanhóis. Há os que querem a integração, a anexação, o desaparecimento político de Portugal, e isso quase imediatamente, e por quaisquer meios que forem necessários. E há os que desejam o mesmo objectivo, mas a conseguir gradualmente, em cinquenta ou setenta anos. Os primeiros são cerca de 90%, os segundos formam os restantes 10%. Isto faz parte da alma espanhola, não vejo como modificá-lo. (...) Acredite, eu faço parte dos dez por cento, não quero violências, tudo em amizade",(in Franco Nogueira, ex-ministro do Negócios Estrangeiros, "Diário: 1960-1968" ).

Em suma:

Sempre que há maiores dificuldades económicas e sociais – ou maior consciência delas – surgem oportunidades para a propagação de ideias radicais ou de ruptura; a frustração pode gerar revolta e esta tende, de uma forma ou de outra, a manifestar-se algumas vezes impulsivamente.

Neste Portugal do início do século XXI, não deixa de ser preocupante notar como as necessidades económicas podem influenciar os princípios e fragilizar os valores de um Estado-Nação que tem quase Mil anos; é como se as actuais gerações, e dentro delas muitos cidadãos e políticos, desconhecessem ou não levassem em consideração a História dos seus antepassados e a do País em que vivem.


...

sábado, 25 de julho de 2009

The Fairy Queen: O Let Me Weep



À ópera “The Fairy Queen” de Henry Purcell, tocada pela primeira vez em 1692, não se aplica o habitual paradigma operático que conhecemos hoje em dia, já que nesta obra de Purcell, inspirada em “Sonho de Uma Noite de Verão” de Shakespeare, não sobressai uma lógica dramática óbvia ou uma narrativa contínua.

Tal como sucede na peça de Shakespeare, Titania e o seu marido Oberon discutem a propósito de um jovem rapaz indiano. Por artes mágicas do cruel Oberon, Titania é colocada sob a influência de um feitiço poderoso e como resultado disso, ela envolve-se numa tórrida e bestial relação erótica com um jumento.

Quando o feitiço finalmente termina Titania fica horrorizada com o bestialismo que cometeu por causa do bruxedo lançado sobre si pelo seu amado marido, e mais destroçada fica quando se apercebe que durante o encantamento mágico foi publicamente aviltada e humilhada por Oberon.

É neste momento da Ópera de Purcell que Titania canta aquela que considero a mais famosa área “ O let me weep” (Oh, deixa-me chorar) ou igualmente conhecida como “The plaint” (O Pranto).

«O, let me forever weep;
My eyes no more shall welcome sleep.
I'll hide me from the sight of day,
And sigh my soul away.
He's gone, his loss deplore,
And I shall never see him more.»


É uma área magnífica de uma enorme beleza e simplicidade, na qual a voz é somente acompanhada por baixos contínuos e um solo de oboé que segue como um eco a intensidade emocional de cada lamentação de Titania.

O desafio para quem canta esta área está, primeiro, em conseguir manter a intensidade dramática durante as passagens cantadas e as de acompanhamento instrumental.

Um segundo desafio resulta da repetição do mesmo poema, sendo vital colorir cada passagem com uma tonalidade emocional diferente e apropriada às múltiplas emoções por que passa Titania ao longo do seu lamento. Esta representação é crucial de modo a que o ouvinte acompanhe todo o doloroso processo de tomada de consciência do fim da relação de Titania com cruel Oberon, isto é, o processo emocional de luto relacional que decorre desde do desgosto até à cólera depressiva, e finalmente na percepção do fim do seu casamento com o amado, mas muito cruel, marido Oberon.

Pergunto-me que músicas com mais de 300 anos de idade e tamanha beleza intemporal, intensidade emocional e realismo humano serão escutadas dentro de 3 séculos.~

...

terça-feira, 14 de julho de 2009

Pérolas de Testes Teóricos de Música (Brasil)







«1. Agnus Dei é uma famosa compositora que escreveu música para igreja.

2. Handel era meio alemão, meio italiano e meio inglês.

3. Beethoven escreveu música mesmo surdo. Ele ficou surdo porque fez música muito alta. Ele caminhava sozinho pela floresta e não escutava ninguém, nem a Pastoral, uma MOSSA (moça) que poderia ser a sua Amada IMORTAU e inspirou ele a criar uma sinfonia muito romântica. Ele faliu em 1827 e mais tarde morreu por causa disto.

4. Uma ópera é uma canção que dura mais de 2 horas.

5. Henry Purcell é um compositor muito conhecido, mas até hoje ninguém ouviu falar dele.

6. O Bolero de Ravel foi composto pelo Ravel.

7. A harpa é um piano pelado.

8. Opus Póstuma é música composta quando o compositor compôs depois de morto.

9. Mozart morreu jovem. Sua maior obra é a trilha do filme "Amadeus".

10. A importância de "Tristão e Isolda" reside no fato de que é uma música muito triste. Mais triste que a "Tristesse" de SCHOPING.

11. Virtuoso no piano é um músico com muita moral.

12. Os maiores compositores do Romantismo são: Chopin, Schubert e Tchaikovsky. No Brasil temos Roberto Carlos e Daniel.

13. Música cantada por duas pessoas é um DUELO.

14. Eu sei o que é um sexteto, mas não sei dizer.

15. Stravinsky revolucionou o ritmo com "A MASSACRAÇÃO da Primavera".

16. Carlos Gomes compôs a PRÓTESEFONIA do programa de rádio "A Hora do Brasil".

17. "Carmen" é uma ópera e "CARMINHA Burana" é sua filha.

18. Muitos pesquisadores concordam que a Música Medieval foi escrita no passado.

19. A ópera mais Romântica é a Paixão de Mateus por Bach.

20. Tem dois tipos de Cantatas de Bach: as Cantatas religiosas e as CANTADAS DI PROFANAÇÃO, que ele usou no palácio.

21. Meu compositor preferido é Opus.

22. Chopin fez poucas baladas, pois sofria de tuberculose. Assim não dava para ele cair na gandaia à noite, dançar, beber e curtir as minas (meninas), MAIS parece que ele não era chegado.

23. Cage inventou os 4 minutos de silêncio.

24. Suíte é uma música de danceterias barrocas.

25. Há uma espécie de Corais feitas por Bach, que se chamam Florais e são usados como remédios milagrosos.

26. "Messias" é uma missa de Handel cuja originalidade é ter muitos aleluias.

27. Joseph van Damme, além da arte lírica, é adepto das artes marciais. Não assisti nenhuma ópera dele, mas tenho DVD de 3 filmes dele.

28. Os menestréis e trovadores transmitiam notícias e estavam nas festas. Andavam de cidade em cidade, de castelo em castelo e iam até nos shows de TV.

29. O regente de uma orquestra é igual a um guarda de trânsito maluco porque agita os braços controlando muitos instrumentos na sua frente.

30. "As 4 Estações" é o CD mais vendido da banda do Vivaldi, depois que fez sucesso num comercial de sabonete, que não me lembro o nome agora..

31. Os compositores Renascentistas reviveram a música, pois ela havia sido morta pela Inquisição.

32. As Fugas de Bach são famosas porque ele não queria ficar preso em nenhum sistema.

33. A música eletroacústica é a mais avançada das tendências da música eletrônica hoje em dia. Seus principais compositores são os DJs e a banda Craftwork.

34. O metrônomo foi inventado para os músicos não andarem depressa.

35. Barroco é uma palavra derivada de Bach.

36. Handel compôs muitas peças geniais para COURO.

37. Música atonal é aquela sem som ou que explora o não-som, mais ou menos quase um anti-som. Seus mais importantes criadores são da família Berg: Schoenberg, ALBANBERG e WEBERG.

38. Pierre Boulez e STOQUEHAUZEN são compositores contemporâneos. É raro ser contemporâneo, pois muitos contemporâneos não vivem até morrer.

39. A mais bela sinfonia é a ÓDIO À ALEGRIA de Beethoven.

40. Verdi, já diz o nome, tem sua cor preferida, mas compôs músicas de várias tonalidades.»


(Obrigado ao Sequeira Rodrigues pela partilha destas pérolas)

...

domingo, 5 de julho de 2009

Lisboa



Sabe-me bem regressar a esta cidade. Meia dúzia de dias volta e meia, mesmo no estio, como agora.

...

quarta-feira, 1 de julho de 2009

O SIADAP - Trabalhar para o Estado ou ter um Emprego Público




Trabalhar para o Estado é uma actividade de risco mental cada vez mais acrescido. Não tanto pelo contacto com o público, frequentemente mal-educado e agressivo, nem tão-pouco pelos constantes ataques populares e dos media, agressivamente directos ou torpemente insinuantes mas todos generalizantes, à função pública e aos seus funcionários.

Trabalhar em prol do Serviço Público é cada vez mais, para quem se dedica com empenho ao que faz, um gradual caminho para o desgaste psicofisiológico sendo tal actividade laboral uma prova permanente de resiliência e tolerância, pessoal e relacional.

É evidente que quando escrevo “trabalhar” não quero dizer “ter um emprego” e há de facto muitos funcionários públicos que somente estão nesta última circunstância. O que desconheço é se alguns daqueles que “têm um emprego público” terão começado ingenuamente por “trabalhar para o Estado” tendo gradualmente desistido do empenho inicial por força dos múltiplos factores de desgaste inerentes ao serviço público, acabando por se resignarem a terem apenas “um emprego público" ao serviço do Estado.

Uma recente machadada na “moral das tropas” foi a aplicação do SIADAP, um complexo sistema de avaliação do desempenho dos funcionários públicos que surgiu com a pretensão de avaliar o mérito dos funcionários no exercício das suas actividades, e com isso, permitir recompensar os melhores com promoções na carreira, prémios de desempenho e outras boas práticas laborais de recompensa e motivação dos trabalhadores.

Outra suposta vantagem de tão famoso sistema seria parar com a progressão automática na carreira em função da antiguidade dos funcionários e também bloquear alguns favoritismos e compadrios possíveis e existentes no anterior sistema de avaliação.

Mas, e como diz o povo pleno de razão na sua imensa sabedoria, «de boas intenções está o Inferno cheio».

Para além da complexa burocracia que implica este sistema de avaliação (digno de um qualquer Sir Humphrey Appleby português), o SIADAP não permite a justa avaliação do mérito de todos os funcionários, desde logo pela imposição de quotas para a atribuição das classificações.

Vamos fazer um exercício teórico simples: um Serviço com 10 funcionários é avaliado.
Imaginemos que todos eles trabalham num projecto coeso, inovador e eficiente, pelo que cada um e todos em conjunto, cumprem muito bem as funções que lhes foram atribuídas.
Ora a avaliação individual destes funcionários será desde logo injusta para a maioria dos 10. Porquê? Porque só 5% deles ou seja metade de um funcionário (presume-me que o torso e a cabeça!) poderá ser classificado como Excelente, o que neste caso em particular torna desde logo nula a possibilidade da classificação de Excelente.

Dos restantes funcionários, 20% (neste caso apenas 2 daqueles 10 iniciais) poderão ser classificados com Muito Bom (ou Desempenho Relevante), sendo que todos os restantes terão a classificação de Bom (ou Desempenho Adequado), não obstante todos eles serem muito bons nas respectivas funções, tal como definimos à priori no nosso exercício teórico.

Ou seja, em dez funcionários que são na prática muito bons, apenas 2 serão classificados como tal, ficando muito provavelmente os restantes a remoer a injustiça que lhes foi feita.

Sabendo aqueles 10 funcionários que cada classificação anual de Desempenho Adequado vale 1 ponto, a classificação de Desempenho Relevante vale 2 pontos e a raríssima classificação de Excelente vale 3 pontos, e que é necessária uma acumulação de 10 pontos para que um funcionários possa progredir na carreira (e mesmo assim tudo depende da disponibilidade financeira do Serviço ou da boa vontade dos Dirigentes), 8 elementos do nosso grupo original de funcionários terão que esperar 10 anos para progredir e mesmo assim tudo depende da aleatoriedade das condicionantes antes referidas.

É claro que algumas almas iluminadas podem dizer: «ah, então face às quotas, vamos fazer uma atribuição de classificações rotativa, ou seja, este ano são estes 2 funcionários, para o ano são outros 2, e assim sucessivamente». Ora, não basta a injustiça do sistema, vamos também torná-lo ainda mais ofensivo, descaradamente manipulável e absurdo?

Quais os efeitos que este actual sistema de avaliação têm na coesão dos grupos, ou na moral e motivação dos funcionários? Posso dizer, por experiência própria e pela experiência do atendimento clínico a funcionários severamente deprimidos em consequência do SIADAP, que os efeitos são graves e cruéis.

Além disso, não é necessário ser um génio para perceber que aquilo que subjaz à implementação de um tal sistema de avaliação não é um paradigma de justiça e de recompensa na avaliação do mérito mas outrossim a criação de um meio burocrático e artificial que impede a progressão dos funcionários, essencialmente por motivos orçamentais.

Mas se um suposto objectivo da implementação de um sistema de avaliação também seria o aumento da produtividade do sector público do Estado, como poderá isso ser alcançado num ambiente cada vez mais imbuído de desconfiança, de medo, de inveja, de desmotivação e de revolta pela acumulação de injustiça, pela arbitrariedade mascarada de rigor e a perspectiva da estagnação profissional quer se seja eficiente quer não?

Porque não se avalia agora então a percepção dos funcionários no que concerne à implementação do actual sistema de avaliação?

Afinal de contas o objectivo mais importante é, de facto, que os funcionários trabalhem e produzam cada vez mais e melhor sendo recompensados em função disso ou o pretende-se desmotivar sub-repticiamente o tecido produtivo do Estado, fazendo a apologia da mediocridade através da descrença e da desmotivação, para que haja justificação para a tão propalada redução de pessoal ou para a privatização de Serviços?

Quanto a mim, e sempre que fui avaliado absurda e injustamente (como pode ser comprovado se efectuarmos uma análise objectiva dos meus relatórios anuais de produtividade, que elaborei e publiquei por iniciativa própria desde 2001 muito antes deste actual sistema ser implementado), para descontrair-me do sistema kafkiano e de autêntica tortura chinesa que constituem as chamadas “reuniões de avaliação”, decidi usar um mecanismo de defesa mental enquanto decorre o suplício: tento “pensar no vazio” e visualizar o hemiciclo da Assembleia da República numa tarde de sexta-feira. Deu sempre resultado.

Não, esta não é uma boa reforma do sistema de avaliação do desempenho dos funcionários.
...